terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

aborto: mais do mesmo.

não, eu não tenho nada de novo para falar sobre a tal campanha que tá rolando por aí ‘a favor da vida’ e contra a descriminalização do aborto.  mas também não, não conseguiria deixar de dar minha opinião, ainda que o principal propósito neste ato seja o meu próprio de refletir/elaborar/redigir sobre a questão.

meu raciocínio tem início na frase logo ali em cima. só eu acho paradoxal uma campanha que se diz a favor da vida pregar a criminalização de algo que, por carregar tal status, leva a morte inúmeras mulheres país afora? sim, pois enquanto você posta sua foto-gestante-pele-e-cabelos-maravilindos pra tua tia-avó curtir e perguntar quando vem o próximo, enquanto você escreve o quanto sua gravidez foi uma escolha, o quanto seu bebê é uma benção e a maternidade é dádiva na vida da mulher, tem mulher morrendo por não ter direito de escolha sobre o próprio corpo. pois é.

a meu ver a questão não é a vida. sou sempre a favor da vida. (sou daquelas que se encontra minhoca no meio da calçada busca o jardim mais próximo e a coloca numa sombrinha. sim, eu faço isso.) e, sendo a favor ou contra a descriminalização do aborto, não vejo alguém em sã consciência divulgando textos/fotos com um #contraavida por aí. não pega bem, né? tua tia-avó não ia curtir. vamos mais além?

perdoem-me se pareço minimizar toda a questão, mas esse mimimi e toda a discussão me dá uma leve impressão de ser levada de volta(?) aos anos 1960: surgimento da ´pílula anticoncepcional, mulheres ganhando autonomia sobre o próprio corpo, ‘sociedade-machista’ em choque. que preguiça disso. sério. alo-ôu! abortos já são feitos, quer você goste ou não. manter tal prática na criminalidade não fará com que eles deixem de ser feitos. descriminalizar só dará condições seguras para as mulheres seguirem em frente com a escolha que já estão fazendo. não é uma campanha pró-aborto. não vão sair distribuindo cartilhas nas escolas de 'como fazer seu próprio aborto'. descriminalizar significa regulamentar. qual é a do chilique por conta disto!?

o que mais me surpreende nisso tudo é ver mulheres a favor de que o Estado decida por elas o que fazer ou não com o seu corpo. oi? como eu vou discutir com uma MULHER que acha que as MULHERES não devem ter autonomia sobre o próprio corpo? e, mais que isto, me entristece a falta de sororidade nos discursos que vejo: “se sua mãe pensasse assim, você poderia não ter nascido”; “o que vai ter de mulher fazendo filho e abortando por aí”; “fazer é bom, né?”. essas frases foram tiradas de redes sociais, todas – e tantas outras – escritas por perfis femininos. querida, se minha mãe pensasse assim, ela deveria ter o direito de escolha sobre o seu corpo - eu daria outro jeito de chegar nesse mundo. vai além da minha capacidade de compreensão como uma mulher - mãe ou não - pode sinceramente crer que aborto vai virar método contraceptivo. é sério que essas mulheres não pensam que poderiam ser elas ou suas filhas/irmãs grávidas de alguém com quem não desejariam ter um filho? ou num momento delicado da carreira? ou simplesmente por que não desejam ser mães? é tão difícil assim colocar-se no lugar da outra? da que não pode bancar um filho, da que já é abandonada pelo pai da criança - é preciso de pai pra fazer, sabia? onde estão os pais ausentes nessa discussão? - ainda na gestação. você pode afirmar agora que nunca faria um aborto, parabéns. é um direito de escolha teu. deixe outras mulheres terem o delas também.

sendo mulher, e mãe de uma menina, sou a favor da vida, sou a favor da escolha, da autonomia da mulher sobre o seu corpo. quem deve decidir sobre o aborto ou não é a mulher. mas, como disse lá em cima, nada de novo. mais do mesmo.


4 comentários:

  1. é aquele mais do mesmo mesmo: gente cagando regra pra vida dos outros baseado em hipocrisia (muitas vezes religiosa). político abafando o diálogo de um tema importante pra näo perder voto (impressionante como näo se fala sobre aborto, diversidade sexual e legalizaçäo de drogas em campanha eleitoral, né?)

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    1. tão fácil decidir pelo corpo do outro, né? sem paciência. mesmo.

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  2. Mas meu pai, se nao fosse o teu instagram eu nao saberia desse blog o.O

    Eu concordo em genero, numero e grau com voce. Mas nao adianta, essas questoes sempre serao polemizadas, nao importa onde nem quando. Na Alemanha foi há pouco tempo decidido que nao se precisa mais de receita pra comprar a pílula do dia seguinte. Resultado: polemica. Muitos contra, muitos a favor. Eu sou pró-vida, mas também pró-escolha. A princípio acho que quem faz sexo tem também que ter maturidade suficiente pra se prevenir contra doencas e contra uma gravidez indesejada. Mas caso uma menina ou mulher seja surpreendida e nao tenha a mínima condicao (principalmente psicológica ou de saúde, porque a condicao financeira sempre se dá um jeito) ela tem o direito de tomar a decisao dela. Afinal, ter um filho é difícil até pra quem os desejou muito e acho que só quem pode dar amor e atencao os deveria colocar no mundo.

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    1. ah que bom que cê achou! tb tô curtindo super seus textos...! :)
      e assunto polêmico, não tem jeito, vai existir em qualquer canto, o tempo inteiro... importante é discutir sempre. só assim para refletirmos sobre e descobrirmos qual é a nossa posição perante a eles, né?

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