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terça-feira, 8 de março de 2016

oito de março.

quer me desejar um feliz dia da mulher? me pague um salário equivalente ao que ganham homens da mesma idade e com mesma escolaridade que eu. lute por um mercado de trabalho que trate da mesma forma pais e mães. apoie a legalização do aborto. aceite o ‘não!’ que eu te disse na balada sem me chamar de vagabunda. disfarce a cara de surpresa quando eu te contar que tenho uma filha pequena e saio a noite e bebo e fumo e trepo. guarde pra você os comentários sobre o tamanho da minha saia, junto com o que você pensa sobre meus mamilos estarem marcando a blusa. não elogie minha filha dizendo que ela ‘é linda e vai dar um trabalhão pro pai quando crescer’. não me chame de ‘meu amor’ se você está apenas me atendendo numa loja. guarde pra você comentários machistas e não se justifique dizendo que o que você falou ‘foi só uma piadinha’. se uma mulher apontar machismo na tua fala, apenas acate e reflita. pare de achar que eu preciso de um homem para me sentir plena, feliz e segura. deixe minha filha crescer livre ser o que ela quiser ser. crie você também o seu filho para crescer livre e ser o que ele quiser ser, vai que ele descobre que quer ser uma mulher e você tava aí pensando que não precisaria ser preocupar com os direitos das mulheres...
#nãoqueroflores #DiaInternacionaldaMulher

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

#desafiodamaternidade ou 'tô fora de padecer no paraíso!'

conseguir parir, mesmo sofrendo violência obstétrica, querer ter meu corpo e minhas escolhas respeitados pela equipe médica. aceitar que o parto que tive foi o parto possível para mim e para minha filha naquele momento, com as informações que eu tinha naquele momento.

passar pela abissal solidão do puerpério.

afirmar-me constantemente como mãe-capaz para parentes, amigos e sociedade em geral compartilhando e explicando minhas escolhas-fora-da-caixa.

morar sozinha com bebê de colo por meses. e lidar, ainda, com a solidão imensa que a maternidade traz.

fazer um mestrado com uma filha de 2 anos.

seguir buscando os melhores caminhos para mim e para ela lutando para não entrar no piloto-automático da criação de filhos.

ouvir dos outros que ‘você não devia beber cerveja se ainda amamenta’, nem ‘sair a noite sair a noite se tem filha pequena’, da sorte que tenho da minha filha ter um pai presente e – o clássico – ‘filho é da mulher, né?’

sentir-me a única responsável por cuidar/organizar/decidir sobre questões da vida da minha filha como a sua rotina semanal, qual escola vai estudar, se faz ou não atividades extra-classe, quando e a qual pediatra/dentista levar, etc. e, sendo aquela que 'dá a palavra final', arcar com as consequências/dúvidas/inseguranças que essas decisões trazem.

argumentar – agora diretamente com ela – que rosa não é cor de menina; que homens podem beijar homens na boca, se isso os faz felizes; que a moça dirigindo o ônibus pode dirigir o ônibus e qualquer outra coisa que ela tiver afim de dirigir; que antes de casar com o príncipe, a princesa bem podia viajar/estudar/conhecer outros príncipes; que o cabelo dela pode ser cacheado, liso ou do jeito que ela quiser.

ser rotulada de chata por questionar a normalização do consumismo infantil; questionar a adultização das nossas meninas; questionar a medicalização da infância. por questionar tudo o tempo todo...

estes são meus desafios da maternidade. perdoem-me, mas disto não tenho foto. sou feliz em ser mãe apesar disso. o amor, o cheirinho de bebê, as fofurices, os marcos de desenvolvimento, os sorrisos, os abraços fazem parte da maternidade sim. mas os fatos acima listados são o que me fazem a mãe que sou hoje e da qual me orgulho.

são só três anos nesse papel, ainda vou passar por muita coisa das quais não faço ideia que me esperam, mas quero sempre lembrar desse início, quando percebi que maternidade é paradoxal e que a foto beijoca-do-pai-na-barriga está bem longe da realidade do dia a dia.


tô fora de padecer no paraíso.    

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

escuta.

num grupo de maternidade duma rede social surge um debate polêmico sobre o racismo. e outro. e mais um. e tantos mais. para não sair – tanto – do âmbito do grupo, eles tem como provocadores o uso de slings por mulheres brancas, uso de turbantes também por elas, uma campanha numa loja de roupa infantil de gosto duvidoso, etc.

na atual conjuntura, tenho a impressão de que qualquer tema pode ser gatilho de uma discussão acalorada sobre racismo. e não é pequeno o número de pessoas que vejo reclamando do tom destes debates. ‘Parecem dois monólogos!’ ‘Não há escuta!’, ‘Tem respostas muito agressivas!’ – queixam-se.

pois bem, concordo. fossem teatralizados, esses posts contariam com duas pessoas numa praça pública, ambas com megafones, cada uma entoando seus próprios argumentos enquanto engasgam sem ar por ignorarem as virgulas do discurso. me incomodam esses bate-bocas online – que nada tem de virtuais, pelo contrário, são bem reais - onde parece que o autor do último comentário sequer refletiu/digeriu a fala do penúltimo comentário. mas considero esses 'duplo-monólogos’ extremamente válidos, pois, em muitos casos, é a primeira vez que a segunda voz é falada em praça pública.

e a ideia destas discussões parecerem dois monólogos incomoda demais. incomoda, pois até pouco tempo o dono da voz era só um: o do branco, neste caso. o do homem, no caso do feminismo. o dos héteros, no caso do movimento LGBT. e assim por aí vai.

e o tom incomoda mais ainda, pois ele agora é de igual para igual. nessa praça todos tem direito a um megafone.

mas, voltando as discussões acerca do racismo, não posso dizer que são agressivas as falas das mulheres negras acerca da apropriação cultural no uso de slings ou turbantes pelas mulheres brancas, pois eu nunca estive no lugar do negro para saber se o meu discurso enquanto mulher branca é agressivo. e preciso do olhar do outro para me dizer agressiva ou não.  se uma senhora negra passa pela vitrine de uma loja de roupas e se horroriza com manequim negro – ou pintado de preto, como os porta-vozes da marca idiotamente insistem em dizer – virado de cabeça para baixo, o sr.  Rony Meisler deve enfiar a viola no saco e admitir o incômodo que causou. sendo mãe de uma criança pequena, preciso acreditar num mundo melhor, então prefiro crer que o intuito da marca não foi fazer uma apologia a práticas de tortura durante a escravidão e causar esse ''’’’’desconforto’’’’’’, mas causou. e, sinto muito, mas só o negro tem propriedade pra dizer se isso incomodou ou não. como só a mulher pode dizer se o ‘fiu fiu’ foi desrespeitoso ou não. e, de novo, por aí vai...


por fim, acompanhando esses entusiasmados debates, penso que envolvem, em sua maioria, questões onde dificilmente chegar-se-á a um meio termo. mas o debate é sempre válido. o debate é necessário. e fica aqui uma última provocação: será que essa escuta não está mais difícil, pois agora existem outras vozes nesse debate? 

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

presentes da chuva.

hoje, no caminho entre um passeio e uma reunião, optei por pegar um ônibus em vez de ir de metrô. faço isso poucas vezes por conta do estado em que geralmente se encontram o ônibus da nossa cidade - vergonhosamente sujos, ar condicionado desligado e janelas trancadas - e, além de demorar mais no trajeto por conta do trânsito, estamos naquelas semanas do ano entre um reajuste e outro de passagem quando a tarifa do metrô é mais barata do que a dos ônibus. mas hoje, mesmo atrasada e em dia de chuva, fomos, ela e eu, de ônibus.

apesar de todos os contras, andar de ônibus com uma criança é muito mais legal do que de metrô. enquanto o eficiente caminho por baixo da terra requer esforços nossos para entretenimento da cria, no ônibus o entretenimento está dado: ela olha pela janela. e ela me convida a olhar pela janela com ela. 'olha, mamãe, aquele carro TÃO azul!', 'uaaau um trato-or!', 'uuuum... dois... três... eram três pessoas com guarda-chuvas... pq está chovendo, né mamãããee?', 'olha lá uma estátua de príncipe no cavalo!', 'mas que bagunça esses moços de obra estão fazendo...'

impossível evitar, entro na brincadeira. 'é um carro SUPER azul, né filha!?', 'aonde você acha que vai esse trator?', 'olha aquele outro moço de capa de chuva...', 'quem será aquele moço no cavalo?', 'essa obra é mesmo uma bagunça... olha o tamanho desse buraco!' 

que delícia de jogo!

ainda olhando pela janela, enquanto cruzamos o centro da cidade por uma avenida que há poucos dias teve seu trânsito completamente mudado e que tantas pessoas reclamaram, ela não se importa com o trânsito lento e, após contar meia dúzia de poças, afirma:

'as poças são presentes da chuva para mim... por que eu gosto de pisar nelas quando eu tô de galochas'



posso querer a companhia dela para sempre? posso querer nunca ficar cega deste olhar tão encantado para tudo? me apaixono.

<3 

terça-feira, 27 de outubro de 2015

#primeiroassédio

todas nós temos histórias de um primeiro assédio. todas nós temos histórias de muitos outros assédios mais. eles vieram de pessoas que deviam nos amar e nos proteger, mas que nos marcaram pra sempre com cenas que acabamos guardando lá no fundo da memória para que nunca sejam lembradas. vieram de completos estranhos que acham que não fizeram nada demais com aqueles olhares, palavras ou toques.

me embrulha o estômago pensar nas grandes chances que minha filha tem de passar por isso, de sentir o mesmo medo, constrangimento, nojo e culpa que eu senti por tantas vezes, por tanto anos. será que ela também vai demorar mais de vinte anos para entender que a culpa não é dela, que não é ela a se sentir constrangida, que não é ela a pessoa nojenta daquele contexto, que ela não precisa sentir medo? e, mais importante de tudo, será que precisa demorar décadas para que ela entenda que não precisa se calar diante disto?

vamos contar sobre o #primeiroassédio, o segundo, o terceiro, o décimo oitavo, o trigésimo! vamos falar sobre isso! até que fique bem claro que não é 'só uma cantada', que a menina de doze anos não é uma 'novinha' e que o corpo de uma mulher pertence a ela e somente a ela.

deu pra entender ou quer que desenhe?

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

carta aberta a quem não anda pra cima e pra baixo carregando um bebê

Prezados seres habitantes de um universo paralelo ao meu onde você não carrega um bebê por aí com você a onde quer que você vá,
este texto é para você, que encontra na rua uma mãe com um simpático bebê sorridente e acaba interagindo com a dupla. Seguem algumas dicas de etiqueta nesta interação:
- pode elogiar a vontade, mas se não tem algo positivo para falar? Não fale. Histórias sobre como a prima do ex-namorado da sua vizinha perdeu de forma trágica um filho com a mesma idade dificilmente vão interessar. Pode ficar só interagindo com o bebê, não tem problema.

- evite colocar a sua mão na mão do bebê. Bebês estão passando pela fase oral, colocam tudo a boca. Sua mão pode até estar limpa, mas a mãe da criança não sabe disso e não vai fazer muita diferença se você falar que acabou de lavar a mão.
- evite passar a mão na barriga de uma grávida que você nunca viu na vida. Acha isso um exagero? Imagine a situação sem a mulher estar grávida. Eu sei o milagre da vida é lindo, mas você sairia acariciando a barriga de estranhos se não fosse o bebê ali dentro? Se faz muita questão de passar a mão, peça. A mãe ainda é a dona da barriga.
- em hipótese alguma ofereça algo para o bebê comer sem antes perguntar a mãe se ele já come ou se ele pode comer aquilo que você quer oferecer. (Isso pra mim vale até para crianças maiores.)
- por favor, nunca pergunte “o que é que ele tem?”, “o que tem de errado com ele?” ou similares quando o bebê está chorando. O que quer que esteja acontecendo, a mãe provavelmente já sabe o que é e já está fazendo o possível para resolver. Se o choro do bebê te incomoda, se retire.
- também não tente adivinhar. Frases como “É fome, por que você não dá a mamadeira?”, “Tá com sono, né? Olha só como está tarde!” ou “Ela não está com frio? Olha a perninha de fora” são comentários absolutamente dispensáveis. Como dito ali em cima, a mãe já sabe o que está acontecendo e já está tomando as providências.
- não diga o que você acha. Sério. Mesmo que você tenha parido 10 filhos e criado mais 10 que foram largados na tua porta e todos eles estejam bem de vida, saudáveis e bem resolvidos. Ainda assim, quem sabe o que é melhor para aquele bebezinho em questão é a mãe dele.
- ofereça ajuda, mas não insista. Por mais enrolada que aquela mãe pareça estar, ela está acostumada a fazer o que quer que esteja fazendo. E se precisar de ajuda ela vai logo aceitar, ou até pedir. Insistir em ajudar enche o saco.
Bom senso, minha gente. Eu sei que não vem de fábrica. Mas pense que você é um estranho e o bebê é a coisa mais importante da vida daquela mãe.
E que fique claro que essas são observações para quando você é um estranho. Amigos e família servem para dar pitacos e interagir! 
Emoticon smile
ass. uma mãe que esteve junto a uma estranha sem noção por 40min num engarrafamento com a filha chorando de sono

segunda-feira, 20 de abril de 2015

a gente não quer só comida.

ele estava ali sentado no chão. usando uma camisa de adulto bem suja. encolhido na frente a loja de roupas. me olhou de longe e sorriu. seguiu observando o troca-troca de colos da minha filha que acabou indo pro chão e também ali sentando.  pediu algo ao pai dela, que negou. e então veio a mim:

- tia, me compra um chinelo?

ele não pediu comida. não contou uma história triste (será que precisava contar?). ele estava descalço e pediu um chinelo. entramos na loja. eu, com filha no colo, ele, animado ao nosso lado, e o pai dela logo em seguida.

- ó tô com ela aqui! – ele avisa de pronto ao segurança, deixando evidente a experiência de alguém que deve ser constantemente expulso daquele lugar. o segurança me olha contrariado, estou claramente quebrando regras ao entrar com Luan naquela loja.

demoramos pra encontrar, a seção de calçados infantis. e quando encontramos ele sabe exatamente qual chinelo deseja.

- tia, pode ser esse aqui!?
- claro, vamos ver... quanto você calça?
- não sei.

experimentamos e, escolhido o chinelo, procuramos o caixa. Luan me conta orgulhoso que já havia conseguido ganhar um boné naquela manhã.

- como? – indago.
- pedindo, ué! uma dona muito linda comprou esse [boné] pra mim na banca.

para me mostrar o boné, Luan levanta a blusa, onde ele o guardou. o corpo miúdo do menino que diz ter 11 anos – mas parece ter 7 ou 8 – veste uma bermuda que deveria ser de um menino ainda menor.

- vamos ver uma bermuda pra você também? – eu ofereço.
- caraaaca, tia! quero uma para combinar com meu chinelo e com meu boné novo!

ele anda pela loja encantado. escolhe a bermuda. fala sobre o boné orgulhoso com a atendente do caixa - que, assim como o segurança, se mostra bastante incomodada com a presença de Luan ali. brinca com os espelhos. e me conta ainda que quer "fazer a sobrancelha que tá na moda".

em algum momento pergunto onde ele mora.
- aqui mesmo em Botafogo. por aqui.

e sua mãe?
- sei não.

e seu pai?
- tá preso.

e por fim, indago:
- Luan, você quer trocar sua bermuda nova aqui?
- claro que não né , tia? vou lá no Parque Guinle que tem cachoeira pra tomar banho. não vou colocar minha roupa nova sujo assim, né? - e confessa - mas antes ainda vou ficar por aqui pra conseguir uma camisa maneira.


ele me agradeceu. deu tchau e cumprimentou minha filha. e eu que, lá no início, pensei que só ia pagar um lanche, saí de lá concordando mais do que nunca com Arnaldo Antunes: a gente não quer só comida.